Estava eu na lida da vida cotidiana, em um espaço do quintal em que podia da rua ser avistada, quando escutei: Hei moça! Faz favor um pouquinho.
Voltei o olhar para o portão e lá estava um Homem magro, de estatura média, aparentando cerca de uns quarenta e tantos anos, porém, penso que deveria ter menos. Me pareceu um tanto desgastado pelas intempéries da vida que por alguma razão “escolheu” viver.
Por ser um desconhecido, o chamarei respeitosamente do Homem do Brócolis.
Fui até o portão. Fitei o Moço por alguns instantes e em fração de segundos me passou pela mente e pelo coração milhões e milhões de pensamentos e emoções indescritíveis. Algo naquele rapaz, de alguma forma, tocou o meu Ser.
Portava nas mãos quatro sacolas meio que surradas de supermercado. As abriu e pude ver que em duas delas havia brócolis meio que amarelecido, porém, ainda, próprio para consumo e em duas havia uma quantidade generosa de quiabo com aparência bem viçosa e me perguntou: quer comprar? Peguei ontem no Supermercado.
Talvez porque demorasse um tanto a responder, por estar imersa em um estranho redemoinho de sensações, ele novamente pergunta: e, então, quer comprar? Eu indago: quanto custa? Ele me diz quatro reais o brócolis e quatro reais o quiabo. Fiquei a me questionar o por quê do mesmo valor para o brócolis que tinha duas cabeças pequenas em cada sacola e para o quiabo que continha uma grande quantidade. Como que telepaticamente lendo meus pensamentos, disse: O brócolis está quase que passando, precisa ser feito logo. O quiabo vai durar mais tempo. Naquele instante percebi que ele tinha noção do que estava vendendo e que estava usando, consciente ou inconscientemente, uma das Leis Universais mais extraordinárias para que a Vida aconteça: O Princípio do Equilíbrio, ou seja, aonde existir uma falta haverá de se ter uma contra parte que equilibra as forças entre si! Novamente fui tomada por uma estranha sensação e, por perceber meu pronunciado silêncio, perguntou: Vai comprar? Respondi: Sim. Vou. Fui buscar o dinheiro. Voltei com uma nota de dez reais. Entreguei a ele, peguei a mercadoria e lhe disse: Está certo. Ele rapidamente respondeu: Não está certo não moça. Tenho que lhe voltar dois reais. Novamente uma sensação peculiar me invadiu e novamente meu silêncio reinou. Retirou do bolso notas desgastadas, porém, bem arrumadinhas de dois reais e me entregou uma agradecendo pela compra e se foi. Neste momento me veio confúcio à cabeça: “A adversidade revela o homem para si mesmo”.
Que surpresa extraordinária ver a adversidade acordando neste Homem a dignidade! Mesmo tendo parcas condições materiais, a dignidade dele prevaleceu sobre a necessidade! Não havia ágio em seus produtos, não havia a intenção de comover emocionalmente para obter vantagens, não havia trapaça na qualidade de sua mercadoria. Estava tão somente trabalhando. A sua dignidade me revelou que dificuldade financeira não é, necessariamente, sinônimo de falta. Que pode existir estilos de vida aonde a prosperidade material não é o parâmetro de relevância e nem a ausência de recursos materiais sinônimo de sofrimento. Que, em determinadas circunstâncias, o menos pode ser mais. A sua dignidade me faz rever uma cadeia de crenças mais desgastada do que a sua desgastada aparência. A sua dignidade me faz acreditar que, de fato, é em épocas de adversidade que as nossas luzes e as nossas sombras se tornam visíveis.

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